O silêncio da madrugada foi quebrado pelo uivo das sirenes. Um som agourento, desesperado, anunciando o que estava por vir. Stela despertou com um sobressalto, o coração acelerado antes mesmo que sua mente compreendesse a ameaça. O ar cheirava a queimado, e uma luminosidade alaranjada tremulava do lado de fora, projetando sombras fantasmagóricas pelas frestas da janela.

Ela saltou da cama e correu até Timont, que dormia profundamente. Seu pequeno corpo estava quente sob as cobertas finas, a respiração lenta e inocente. O medo tomou conta dela com força. Agachou-se ao lado da cama e o sacudiu com urgência.

— Timont, acorde! Precisamos sair daqui! — sua voz tremeu, mas o pequeno abriu os olhos devagar, confuso e sonolento.

O chão vibrou sob seus pés quando o primeiro estrondo os atingiu. A casa tremeu, os vidros da janela estalaram. Stela engoliu um grito, puxando Timont para seus braços. Descalça, atravessou o corredor enquanto a poeira caía do teto e as tábuas rangiam ameaçadoramente.

Quando a porta se abriu com um estrondo, não foi o impacto de uma explosão, mas a presença firme de Philip. Ele surgiu no limiar, como uma sombra alta e forte, os olhos brilhando de alerta. A poeira e a fuligem manchavam seu rosto, seus cabelos pretos estavam desalinhados, e a expressão severa transmitia uma única mensagem: tempo era um luxo que eles não tinham.

— Venham comigo! — ordenou, sua voz cortando o caos ao redor.

Stela não questionou. Com Timont preso em seus braços, correu em direção a Philip. Ele agarrou seu braço com firmeza e a puxou para fora, guiando-os pela noite iluminada por chamas e explosões distantes. O som de aviões rasgando os céus misturava-se aos gritos de desespero das ruas.

Quando um novo impacto sacudiu o chão, Philip a segurou contra seu peito, protegendo-a dos destroços que caíam ao redor. Por um instante, o tempo pareceu parar. O cheiro de fumaça, o calor sufocante, o coração de Timont batendo rápido contra seu peito. E os olhos de Philip, encontrando os dela. Havia algo ali, algo silencioso e absoluto, como um elo invisível que os conectava sem que precisassem dizer uma palavra.

Mas o momento se dissipou tão rápido quanto surgiu. Ele os puxou novamente, conduzindo-os por becos e ruas, evitando as áreas mais atingidas. Seu corpo era um escudo, sua força era inabalável. Cada passo era uma promessa silenciosa de que não os deixaria para trás.

Quando finalmente chegaram a um local seguro, um abrigo improvisado onde outras famílias se reuniam, Stela caiu de joelhos, segurando Timont contra si. Seu peito subia e descia rapidamente, a adrenalina ainda pulsando em suas veias. Olhou para Philip, que permanecia de pé, a respiração pesada, os olhos escaneando o entorno como se ainda estivesse no campo de batalha.

Ele não disse nada, nem precisava. Mas naquele instante, Stela soube. Philip Lancaster era um homem moldado para proteger. E, por mais que não entendesse completamente, ela se sentia segura ao lado dele.

***

O silêncio que se seguiu ao bombardeio era quase tão ensurdecedor quanto as explosões. O abrigo improvisado estava cheio de famílias assustadas, crianças chorando, mães tentando acalmá-las, homens com olhares vazios. Stela sentia seu corpo tremer, mas não sabia se era pelo frio ou pelo medo que ainda não se dissipara.

Timont dormia em seu colo, exausto após o terror da noite. Os dedos pequenos estavam fechados em punhos sobre o tecido sujo do vestido de Stela. Ela passou a mão pelos cabelos dele, tentando absorver algum conforto daquele gesto familiar.

Philip estava ao seu lado, observando o abrigo com olhos atentos, como se esperasse que o perigo ainda os alcançasse. Ele parecia inquebrantável, mas Stela sabia que até mesmo os homens mais fortes carregavam cicatrizes que ninguém via.

Foi ele quem quebrou o silêncio primeiro.

— Você não pode ficar aqui.

Stela ergueu os olhos para ele, piscando algumas vezes para afastar a exaustão.

— Eu sei. — Sua voz saiu fraca, mas firme. Ela não tinha mais casa. Não tinha mais nada.

Philip soltou um suspiro, cruzando os braços.

— Minha casa é segura. Você e Timont podem ficar lá. Pelo tempo que for necessário.

A ideia a fez engolir em seco. Durante anos, Philip estivera à margem de sua vida, um guardião distante, um homem de poucas palavras e presença marcante. Agora, ela cruzaria essa linha, entrando em seu mundo.

— Não quero ser um fardo. — murmurou, olhando para o chão.

Philip franziu o cenho.

— Um fardo seria deixá-los desamparados. Vocês vêm comigo, Stela. Não há discussão sobre isso.

Ela não soube o que responder. Talvez porque, no fundo, uma parte dela soubesse que era a única opção.

Ele a observou por um instante e, então, de forma surpreendentemente gentil, disse:

— Você e Timont precisam de um lar. Eu posso oferecer isso.

A gratidão apertou seu peito. Stela assentiu, sem confiar que sua voz não falharia.

Philip não esperou mais nada. Ele simplesmente se virou e começou a caminhar em direção à saída.

— Vamos.

E Stela soube, com uma certeza que a assustava, que sua vida nunca mais seria a mesma.

A caminhada até a casa de Philip foi silenciosa. O céu ainda carregava vestígios de fumaça, e o cheiro de pólvora pairava no ar. Stela segurava Timont firmemente pela mão, enquanto ele, ainda sonolento, tropeçava a cada poucos passos. Philip caminhava à frente, atento a cada som, a cada movimento ao redor, como se ainda estivesse em uma zona de combate.

Quando chegaram à casa, Stela parou por um instante, hesitando diante da porta de madeira escura. Não era um lar para ela, apenas um refúgio temporário. Mesmo assim, parecia um novo mundo, algo desconhecido e intimidante.

Philip abriu a porta e deu um passo para o lado, permitindo que ela entrasse primeiro. O interior da casa era simples, mas acolhedor. O cheiro de madeira e terra molhada misturava-se ao calor do ambiente. Ele acendeu um lampião e o deixou sobre a mesa, lançando sombras longas pelas paredes.

— Há um quarto nos fundos — disse ele, apontando para uma porta ao lado da sala. — Você e Timont podem ficar lá.

Stela assentiu, guiando Timont para dentro. O menino esfregou os olhos e, sem pensar duas vezes, deitou-se na cama de canto, adormecendo quase instantaneamente. Ela sentou-se ao lado dele, observando a respiração tranquila do irmão.

Philip permaneceu parado à porta por um momento, como se avaliasse o que dizer. Por fim, soltou um suspiro curto e passou a mão pelos cabelos escuros.

— Amanhã podemos ver o que sobrou da sua casa. Talvez possamos recuperar algo. — Sua voz era firme, mas sem frieza.

Stela ergueu os olhos para ele, surpresa com a sugestão. Não esperava que ele se importasse tanto com suas perdas materiais.

— Obrigada, Philip. — Sua voz saiu mais baixa do que pretendia.

Ele apenas assentiu e se virou para sair, mas antes de cruzar a porta, parou e olhou por cima do ombro.

— Você está segura aqui. — Foi tudo o que disse antes de desaparecer no corredor.

Sozinha no quarto, Stela sentiu uma estranha mistura de alívio e incerteza. Philip era um homem de poucas palavras, mas suas ações falavam alto. E agora, debaixo de seu teto, ela sabia que sua vida estava prestes a mudar, de formas que ainda não conseguia compreender.

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